31 de março de 2021

Jurisprudência STJ – Informativo nº 0689 de 22/03/2021

1 – Processo: REsp 1.857.852-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/03/2021

Ramo do Direito: DIREITO CIVIL

Tema: Partilha. Ausência de citação de litisconsorte necessário. Sentença juridicamente inexistente. Tese firmada pelo STF. Tema n. 809/STF. Aplicabilidade.

Destaque:É imperiosa a aplicação da tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do tema n. 809/STF, que impõe a igualdade de tratamento no regime sucessório entre cônjuges e companheiros, em processo cuja inexistência jurídica da sentença de partilha, ante a ausência de citação de litisconsorte necessário, impede a formação da coisa julgada material.

Informações do Inteiro Teor

A controvérsia resume-se em definir se a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do tema n. 809/STF, segundo a qual “é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime do art. 1.829 do CC/2002”, é aplicável na hipótese em que, a despeito da existência de sentença de partilha irrecorrida que homologou acordo celebrado pelos colaterais, únicos herdeiros conhecidos ao tempo de sua prolação, houve o superveniente reconhecimento de herdeiro apto a exclui-los da linha sucessória.

De início, deve-se considerar que diante do surgimento de provável herdeiro, deve o juízo do inventário, mesmo após a prolação de sentença homologatória de acordo de partilha irrecorrida e antes da expedição do respectivo formal, reconhecer a existência de vício grave consistente na ausência de citação de litisconsorte necessário e, assim, a inexistência jurídica da sentença por ele proferida, que não transita em julgado e tampouco forma coisa julgada material.

Assim, não há que se falar em coisa julgada na sentença proferida em processo em que não se formou a relação jurídica apta ao seu desenvolvimento.

Ressalta-se que a inexistência jurídica da sentença pode ser declarada em ação autônoma (querela nullitatis insanabilis) e também no próprio processo em que proferida, na fase de cumprimento de sentença ou até antes dela, se possível, especialmente na hipótese em que a matéria foi previamente submetida ao crivo do contraditório e não havia a necessidade de dilação probatória.

Em virtude dos limites subjetivos da coisa julgada, o formal de partilha será título executivo judicial apenas em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular ou universal, não alcançando, contudo, terceiros, como o litisconsorte necessário não citado para o inventário.

Com efeito, declarada a inexistência jurídica da sentença na própria ação de inventário, deve ser aplicada a tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do tema n. 809/STF, por meio da qual foi declarada a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002.

2 – Processo: REsp 1.913.236-MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/03/2021

Ramo do Direito: DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema: Pequena propriedade rural. Impenhorabilidade. Art. 833, VIII, do CPC/2015. Bem explorado pela família. Ônus da prova do executado. Única propriedade. Desnecessidade. Garantia hipotecária. Não afastamento da proteção.

Destaque: Para a proteção da impenhorabilidade da pequena propriedade rural é ônus do executado comprovar que o imóvel é explorado pela família, prevalecendo a proteção mesmo que tenha sido dado em garantia hipotecária ou não se tratando de único bem do devedor.

Informações do Inteiro Teor

Vale ressaltar que para reconhecer a impenhorabilidade nos termos do art. 833, VIII, do CPC/2015, é imperiosa a satisfação de dois requisitos, a saber: (i) que o imóvel se qualifique como pequena propriedade rural, nos termos da lei, e (ii) que seja explorado pela família. Até o momento, não há uma lei definindo o que seja pequena propriedade rural para fins de impenhorabilidade. Diante da lacuna legislativa, a jurisprudência tem tomado emprestado o conceito estabelecido na Lei n. 8.629/1993, a qual regulamenta as normas constitucionais relativas à reforma agrária. Em seu artigo 4º, II, alínea “a”, atualizado pela Lei n. 13.465/2017, consta que se enquadra como pequena propriedade rural o imóvel rural “de área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento”.

A Terceira Turma desta Corte, na vigência do CPC/1973, orientava-se no sentido de que, para o reconhecimento da impenhorabilidade, o devedor tinha o ônus de comprovar que além de pequena, a propriedade destinava-se à exploração familiar. Ademais, como regra geral, a parte que alega tem o ônus de demonstrar a veracidade desse fato (art. 373 do CPC/2015) e, sob a ótica da aptidão para produzir essa prova, ao menos abstratamente, é certo que é mais fácil para o devedor demonstrar a veracidade do fato alegado. Demais disso, o art. 833, VIII, do CPC/2015 é expresso ao condicionar o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural à sua exploração familiar. Isentar o devedor de comprovar a efetiva satisfação desse requisito legal e transferir a prova negativa ao credor importaria em desconsiderar o propósito que orientou a criação dessa norma, o qual consiste em assegurar os meios para a manutenção da subsistência do executado e de sua família.

Com efeito, a ausência de comprovação de que o imóvel penhorado é explorado pela família afasta a incidência da proteção da impenhorabilidade.

Além disso, a Lei n. 7.513/1986, responsável pela inclusão do inciso X ao art. 649 do CPC/1973, exigia expressamente que o imóvel rural constrito fosse o único bem do devedor.

Ocorre que a Lei n. 11.382/2006, responsável pela alteração do antigo diploma processual, já não mais previa esse requisito. As legislações constitucional e infraconstitucional que se seguiram nada referem, também, acerca da necessidade de o bem penhorado ser o único imóvel de propriedade do executado.

Disso se extrai que ser proprietário de um único imóvel não é pressuposto para o reconhecimento da impenhorabilidade com base na previsão do art. 833, VIII, do CPC/2015.

Por fim, a orientação consolidada desta Corte é no sentido de que o oferecimento do bem em garantia hipotecária não afasta a proteção da impenhorabilidade, haja vista se tratar de norma de ordem pública, inafastável pela vontade das partes.